10 de dezembro de 2008

hit the road, jack

no meio do turbilhão
da tempestade
da multidao

passagem
fronteiras
e um corpo
feito
muitos

de estilhaços
de estrada
cartas de amor
e outras explosividades
poéticas

2 de dezembro de 2008

organicidade estranha

minha cabeça flutua. meu coração anda por vazios. meus olhos desfocam e voltam. e ainda assim meus pés pisam o chão.

minha pele se encharca. se enruga. transpira e seca. banha-se. treme. toca e sente calor. ou sente o vento. ou se sufoca. mas respira.

minha pele não sabe, não tem como saber. pede abraços pros meus braços. anseia por uma sensação que não conhece, seja por inexperiência ou desmemória. a pele troca rápido e sensações antigas viram mito-de-pele. como as histórias de nossos avós.

meu coração bate. o vento entra direto em meu peito e preenche espaços, só para deixá-los novamente. meu coração vagueia por uma sensibilidade masculina. estou em uma terra sem palavras.

mas meus pés, ainda assim, pisam o chão.

27 de novembro de 2008

pequenas coisas

impressionante como ter conseguido comprar escova de dente nova e desodorante me deixou feliz. pequenas coisas, cuidados pessoais no meio do caos. como ter cortado os cabelos. e vai ser bom conseguir fazer a barba.

aliás, "desodorante" no meu caso significa "leite de magnésia + alguma essência em um pote de roll on reutilizado". te deixa sem cheiro (fora o da essência), é biodegradável, mais barato, não precisa ser comprado com tanta freqüencia (umas duas vezes ao ano) e não te impede de suar. sério, fiquei assustado quando me dei conta que praticamente não havia suado debaixo dos braços desde os 12 ou 13 anos.

não entupa suas glândulas sudoríparas. isso deve evitar algum tipo de câncer.

17 de novembro de 2008

livro de pré-coisas


ando saindo dos lugares com partes das pessoas. as pessoas tem durado em mim, ido pra casa comigo, ficando em meu corpo e espírito, reverberando. ando sensível às pessoas, aberto pra elas. um tanto entregue, um tanto esperas que espero deixar pra lá, mas um tanto ainda mais feliz do que encontro seja lá o que for: diversão genuina, não importa a forma.

ando sensível às pessoas, mesmo quando duro em mim. e noto para além, em um logo-após... que as pessoas que duram, com seus presentes, sentimentos, cores, cheiros... com seus jeitos, mas mais, com o que está por trás deles, retumbares, tambores íntimos, espíritos como sons de flautas.

as pessoas unem-se à multidão que me habita. a multidão que habito, na qual vago, através da qual sou. que batalha por ser eu. as pessoas unem-se como forças maiores, personagens externos que entram na dança de minha multidão, cheia de argumentações, opiniões contrárias, e às vezes concordâncias em formas de insight. alívios...

mas as pessoas são mais do que esses personagens. são vida, que me bate na pele e dança comigo em meu corpo. quando a multidão não tem mais máscaras, ou opiniões, e sobra só o movimento, é que acesso a parte mais clara, profunda apenas porque de certa forma obscura, a parte mais mundo e mais tudo do que tudo. esse abismo sem nome, quase sentimento, da onde tudo o mais vem, até a falta.

eu chamo de amor. porque não tem como chamá-lo sem com algo que apenas sugira, apenas contorne. nunca se abraçará o abismo completamente. e essa sempre foi a sabedoria dos xamãs... e dos poetas.

16 de novembro de 2008

na saudade da calada

ontem a saudade veio forte, impetuosa. que crescia lenta em caminhos por entre mim, crescia calma, ia e voltava, abanava, abraçava. mas ontem veio forte.

abriu caminho pra tristeza. talvez tenha passado por entre os músculos dessa vez... por entre o sono. por sobre alguma defesa. veio e abateu, gentil e severa em uma só medida... agradeceu-me, também, por viver.

e eu lhe agradeço, é claro.

agradeço um choro, um mais do que fagulha de presença. a calma na arena da mente.

agradeço, sorrio... e calo.

12 de novembro de 2008

Primavera em despertos

Um dia como hoje é de soltar todas as crianças num espaço com grama, todas as crianças internas em um espaço infinito, todas as crianças libertas para que sejam belas, para que sejam crianças. Correr o vento, abraçar o Sol, sentir os cheiros do tempo, tempos de antigamente feitos presente, tudo um presente, tudo agora.

Um dia como hoje é de chorar o desespero de lugares fechados, chorar o adulto que nem percebe o que se sucede, lá fora o mais adentro, seu avesso a pura superficialidade cinza, e a criança que bate no peito adormecido como em barras. A pele que não o sente chorar, que o mundo feito liberdade não penetra nesse prédio asséptico, porque liberdade em verdade não briga de frente, apenas transita, implode, suspira e corre...

11 de novembro de 2008

A noite guarda um
sorriso
liso
embebido
fácil

sorriso escorrido
que despenca
pelo canto da boca
despenca
feito desejo torto
vai ao chão conosco
fica com dor de ressaca

como o corpo que escorre
dos ossos
e a mente bamba
que talvez a gente lamente

e a mensagem
que borrada
fica na dúvida
se samba
ou não

7 de novembro de 2008

Primavera em flor

uma flor me inundou na rua. eu virei cheiro.

milhares de flores caídas, sinais de Primavera com vento. liberdade, alento... o vento traz saudades.

sinto uma falta preenchida no peito. sorrio a espreita. só lamento não ter mais e mais tempo quando tenho.

5 de novembro de 2008

Próximo Domingo:



Venham, venham! A casa é nossa! E com ela os sonhos que circulam, se encontram, se divagam, se deslocam, se embalam, se embelam... Que sejam sendo com nossos corpos!

31 de outubro de 2008

um suspiro entre tropeços

andei bambo pela rua. soltei um suspiro ou outro entre tropeços, senti o vento, mesmo que fosse uma leve brisa. acima de mim, a lua não sei se sorria, mas como me olhava.

não sei se eu sorria. se vinha, sorriso suave, cheio de uma lamentação melancólica. mas dentro de mim, atrás do quase sorriso, de qualquer jeito minha alegria ressoava... de qualquer jeito meu coração batia, minha pele se sabia no mundo. de qualquer jeito eu agradecia.

essa tristeza feliz, que fala de algo que conecta com tudo. essa tristeza de ter um coração, e que ele sai para passear.

andava bambo, pensava. um suspiro entre tropeços.

e o sorriso de um abraço sentido.

26 de outubro de 2008

do vento e dos sonhos

meus sonhos dançam entre a chuva e o vento. meus sonhos, acorados e presentes em frente aos meus olhos, ou olhos que vêem mais do que a palavra diz. meus sonhos, companheiros levados em uma embriaguez sem álcool: de pessoas, emoções, dias.

suspiro. sinto as pernas, os pés tocando o chão, o chão. com o suspiro, faço dos sonhos minha vida, da minha vida mescla. com o suspiro, aterro sonhos, cabeça, paixão, solidão, infância, companhia. dos sonhos, vida; da vida, corpo. faço corpo dos meus sonhos e me mesclo numa energia que atravessa dançando todas as coisas, como musa travessa.

estou aqui. resta vento dentro e fora de mim. resta lágrimas não nascidas, abraços que se antecipam em vontade. resta palavras ditas demais, olhares compassivos que entendem e explicam desdefinindo. restam todos os dias.

os sonhos acordam e dançam serelepes.

21 de outubro de 2008

Celebração

Salve Dionísio
os malditos
os poetas perdidos
Salve os anarquistas
os fanfarrões loucos
os amantes de verdade
os sabedores do Abismo
Salve o sorriso
por debaixo do bigode
de Nietzsche
as curvas
dos antigos
edifícios
os montes
que almas
habitam

Salve os reinos do Céu
no fundo dos teus olhos e dos meus
as danças do Desejo
com e sem pele
esse Desejo solto
irrefreado
e de rosto nebulado

os Doutores da Terra
em nossos corações
Salve
a busca pelo agora
sem começo nem fim
o acontecimento

Salve a inexistência
todas as mazelas
todas as donzelas
contidas nas jovens,
mães e anciãs
todas as bruxas
com suas gargalhadas ótimas
e os piratas
com suas vidas sem fim

Salve os sufis girando
e os mestres
que meditando
sustentam o mundo

Salve o segundo
em que me perco em ti
você-em-mim
e o corpo-sem-nome
que o amor constrói
salve

19 de outubro de 2008

Sábado a noite vivo

a leveza me preenche. aspiro felicidade, inspiro a alma das pessoas, expiro algo que alguém vê pra dançar. ali, sou todo no mais profundo de mim, puramente amor, um amor sem nome no qual simplesmente se transita - eu transito, nós transitamos. e todos sentem. é impressionante, mas todos sentem. uma verdade que causa interesse, uma segurança sem nome, estar, esteja onde se estiver.

explodo silencioso. danço o grito incontido que sai pelos olhos. não há nada senão paz, e é incrível essa paz no meio de qualquer multidão. alcançar o status de ilha por ter mergulhado no mar.

"sou todo seu
sou todo
sou"

queria respirar todas as pessoas.

quero.

14 de outubro de 2008

"não há revolução, luta, caminho... você já é o monarca da sua própria pele."

Hakim Bey

10 de outubro de 2008

se eu fosse tu, eu

se eu fosse tu, eu seria um "tu" de verdade. sem tudo isso que tu primeiro me apresenta, tudo isso com o que tu tanto te enreda, tudo isso com o que tu te enrola e te esconde. seria um tu do "mais além", sem penduricalhos; o "tu" da tua respiração profunda incontida, que se sufoca aprisionada na tua respiração cotidiana.

se eu fosse tu, seria, do teu jeito, exatamente como seria se eu fosse mesmo eu.

5 de outubro de 2008

2 de outubro de 2008

incertezas mundiais

no último mês, estivemos no limite da existência do mundo. ou quase, certo.

por duas vezes, de qualquer forma, eventos "humanos" causaram a possibilidade do mundo sair de seus eixos. por duas vezes, que eu tenha contado, que tenha ficado óbvio, o mundo poderia ter acabado.

a primeira foi a testagem, na França, do maior acelerador de partículas já construído. a chance era remota, mas poderia ter dado em supernova: um buraco negro sugando a tudo e a todos pro meio da terra dos croissants.

a segunda... bem, a segunda foi a maior queda do mercado econômico americano desde 1929. tão risível quanto possa ser, essa crise que ainda se vive poderia desencadear um evento em cascata a ruir bolsas de valores em todos os cantos do planeta.

sejam coisas concretas, sejam imaginadas, estão por aí. também nosso mundo é imaginado. quantos será que tiveram a sensação de que tudo poderia se tornar um espaço branco após a próxima esquina? ou um pandemônio urbano? será que a crise econômica derreteria os pólos?

no mas. simplesmente achei muito engraçada a comparação dos dois eventos. acho que fala alguma coisa sobre o jeito de que se tem andado. humanidade maluca.

25 de setembro de 2008

haikai eleitoral

a cada dia,
uma música ridícula e irritante diferente
na cabeça.

23 de setembro de 2008

Trancos, ancas e narizes de palhaço

Me envolvo em minhas trapalhadas. Fios que fazem minha carne, dão toda a forma das conexões a minha volta.

Sempre essa idéia de fios, "me envolvo, me enrosco, me enredo." Me enrasco.

Porque sempre me esqueço. "Sempre me lembro que já te esqueci" diferente/complementar de sempre me esquecer de lembrar. De olhar. Antes, respirar.

Depois da raiva, o enrosco. Antes também. Mas depois do enrosco de depois da raiva, a graça. A graça é um alívio de consciência. Assim como a raiva, alinha os fios, mas a graça o faz sem a brutalidade que novamente os enreda no logo-após.

A graça clareia a cena-eu. Mais nada, vale por si só. A cena-eu também não é nada, afinal. Mesmo o enrosco. Por isso a graça é o princípio da meditação.

21 de setembro de 2008

antes da porta bater

foi muito bom te ver no Sábado! acabou comigo. e eu tava mesmo precisando acabar.

fazia tempo que não cansava de mim mesmo, mas cedo ou tarde acontece, principalmente quando não cuido de certas coisas. e sigo me impressionando como tenho pontos cegos.

então, acabei. vim só dar um tchau antes de fechar a porta. era uma sala gostosa essa, né? eu não me importava de ficar esperando nela. pelo menos até o final de todas essas revistas de moda. e, de qualquer forma, a luz apagou faz um tempo.

vou eu ficar no escuro. será? esse escuro de espaço. escuro de luz, quem sabe. ou sabe-se lá. depois que a gente acaba, será que ainda pisa em alguma coisa? só vou saber mesmo depois de passar pela porta.

então, acabei. e tchau. era pra isso, isso tudo.

talvez toda despedida fique com um gosto de algo mais para dizer. toda vida fica com alguma coisa não-vivida? é estranho, porque isso não existe. o tanto que não se existe em potência pura. mas finais são finais. como carcaças são apenas carcaças e tudo o mais.

pelo menos depois da saída.

20 de setembro de 2008

Causos Eleitorais

em frente ao Clínicas, uma verdadeira comitiva panfletária faz seu trabalho.

em meio a eles, um homem com um carrinho de mão vende abacaxis. de "Terra de Areia".

15 de setembro de 2008

o poço dos abraços infinitos

pra Ju

entre algumas pessoas existe uma espécie de poço dos abraços infinitos. que seja infinito, o que dá sede não é só a falta de abraços dados, mas o dar abraços em si - que dá vontade de sacar abraços do poço como a tentá-lo diminuir, aliviar um nível tranbordante. sorver do poço dos abraços é viver uma relação mais ainda, um pouco mais ainda, e mais... é ir em frente, onde se deve ir, seja para onde for, mas ir, deixar-se. sorver da amizade, do amor, do abraço.

entre algumas pessoas há um entre que é mesmo incrível. e é uma delícia senti-lo como a dançá-lo.

não importa, então, a distância geográfica que às vezes se imponha. nesse entre, nossos sentimentos dançarão sempre, e esse espaço com certo cuidado fica sempre aquecido. como o poço dos abraços. a única coisa é a sede de beber nele... e a necessidade, que um dia há de ser cumprida, de um mergulho que alivie esse nível transbordante...

13 de setembro de 2008

tudo aqui

acesso outras vidas
na noite
careço de abraços
o choro é um conforto engraçado
e o riso
vem da bênção
de sentir
porque nessa
não há algo
como vidas
que sejam outras

11 de setembro de 2008

11 de Setembro

Aviõezinhos correm pela vila portando explosivos. Chocam-se contra as torres e se espatifam, se despedaçam. Se não a curto, sua missão é suicida a longo prazo.

As torres são marcos constantes que não cessam de ruir. Imagens muito fortes tão concretas em sua abstratilidade que tornam-se indestrutíveis. O ruir das torres é a imagem mais indestrutível que existe.

É nosso marco que reverbera. O ruir ressoa, proclamamos nossas lágrimas televisivas. Os explosivos são alvos claros, importantes. Todo nosso ruir pode representar-se em drama e ocasião. O ruir movimenta a sociedade em uma parada.

Aviõezinhos chocam-se contra as torres. Nós reproduzimos a destruição infinitamente, pelo bem da imagem. Construímos a expressão última que tapa toda origem, quase toda conexão. Repetimos o ruir com gozo. Rejubilamos em milhões de discursos.

É a maravilha televisiva que se tenha tão bons personagens. A tela gera toda sorte de projeções. O cubículo expiatório de gerações auto-mutiladas.

Porque já é velha a sabedoria de que são nossos os aviõezinhos. Nós fabricamos os explosivos. As torres... de quem é a conseqüência das torres?

Jogamos pedra no mundo com gosto. Pouco vale tanto quanto uma falha enquadrada, porque o espetáculo é fim em si mesmo. Por quê? O medo originou toda cena que o justifica. Nada vale tanto quanto a segurança de um medo delimitado. É com gozo que os aviõezinhos explodem, as torres ruem de novo e de novo... e ainda jogamos pedras no mundo.

31 de agosto de 2008

são infinitas as formas;
prometemos experimentá-las todas.

é infinito o Caminho;
prometemos percorrê-lo até o final.

13 de julho de 2008

something like Jim

it sometimes happends to me
lost the mind
let the body go
and the soul
let it flow
and i
lost me
and i
am
no more
or so

how to count it?
and how to tell?

how to keep it?

it´s an endless joke
to roll and come back
a square
it´s an endless joke
so forget it
and stare
there´s anyone laughing?

it ought to be
i except of me
dance it

there´s a state
that doesn´t need
any thought to count the rate
there´s a state
that keeps going
and even if you need
something to show it
to awaken your eyes
and flow it
it´s there already
right now
beneath you
above

and you know it

7 de julho de 2008

Da intensidade das formas

para Aron, Ale e Larissa


há um nível de possibilidades em tudo. um nível de vida completamente intensa, não apreendida.

desse nível decantam as formas, ou se rasgam elas. as formas se impõe. impomos as formas às intensidades, para que se tenha rosto pra contatar, chão pra correr... pra que as intensidades sejam possíveis de serem vividas. as formas também são vida, muito e muito ela.

precisamos de palavras pra fazer passar os sentidos, de rostos e gestos pra passar os afetos. tentamos uma direção única, mas são muitas, inapreensíveis. e o melhor é quando uma palavra não limita o múltplo, mesmo tendo uma direção ou proposta. quando nosso jeito se sabe pouco e anuncia, num mesmo jeito, uma pista de toda a possibilidade: o simples do complexo é ser inteiro.

o que morde é que não há tempo nessa vida para todas as formas. o que morde e também o que liberta. o futuro é uma direção, e é a direção que dá o destino. mas é sempre o presente que importa... e as formas que agora estão. esse arranjo peculiar. e relaxar de saber que todas as possibilidades são concretas e não se limitam a ele. então, somos pouco, mas muito podemos; e não haverá tempo para tudo, então podemos ser o que somos sem ter que sermos tão fortemente afligidos pelo que poderiamos ser.

6 de julho de 2008

Dedicatória

para todo palavrear que exponha a verdade;

para toda verdade que exploda a palavra.

27 de junho de 2008

Desunidades

Difícil contemplar de uma só vez tudo em um ser humano.

1) Os dois meninos carroceiros que maltratam o cavalo porque sim - sem bondade, sem lógica, sem praticidade nenhuma - e então sorriem de felicidade tocante ao encontrarem uma grande quantidade de lixo reciclável já em sacos fechados.

2) Os moradores do São Pedro, tão facilmente reconhecidos como não-sujeitos, tão dificilmente encontrados no olhar, percebidos num algo que se perdeu.

Tudo em um ser humano escapa à captação completa de outro. Podemos apenas sentir que há algo lá que escapa até fronteiras inalcançáveis, talvez inexistentes. Escapamos a nós mesmos, afinal. E por isso nunca daremos certo. Porque o disperso nos faz normalidade... somos muitos que não se dão as mãos. Em última instância... nós não estamos.

10 de junho de 2008

Entre amarras e fugas

Quando Bárbara nos convidou para fugir, levantei da cadeira. O meu mundo aumentou e meu corpo ficou como que suspenso por fios de tensão a puxar de diferentes lados. O mundo aumentou e meu corpo ansiou por ser vento.

Fiquei angustiado pensando nas amarras, compromissos que faço. Fiquei pensando no futuro, compromisso comigo mesmo; na possibilidade de uma liberdade descompromissada. Fui além do sonho, senti no concreto, planejei um sem planos de espontaneidades: pendido entre o plano de fuga e a simples possibilidade de fugir a qualquer momento.

Minhas amarras viram apertos de mão. Meus compromissos, abraços. Talvez mesmo abraços de tchau, de até logo, de adeus. Tudo ditado pelo fluxo do instante de agora e de amanhã. E eu entro calor e alento pra angústia da amarra, pra angústia da fuga. Eu, concretamente, viro e sou todo e apenas respiração.

Senão vento.

2 de junho de 2008

A linha dita
é minha
a linha da face
me faz
e se amaina
em liberdade
a linha suave
rachura
enuveia
e de dentro
brota
uma flor
e muito
muito
vento

16 de maio de 2008

O homem que diz "vou" não vai

Até onde é possível que se vá até que se esgote a si mesmo? Possivelmente por toda uma vida sem consegui-lo. Mas é preciso que o consigo muito antes... é preciso. Pela ânsia de ser algo mais, pela importância de ver algo mais. Se viver, afinal, só servir para ser uma mesma ou várias coisas... não seria cabível ter nascido.

11 de maio de 2008

querido diário,

foi uma semana de não fazer. como eu quero mudar, percebi toda essa expressividade, essa materialidade, que quase vai por si mesma, que sai desse jeito como um jeito de sair. não fazer... deixar decantar seja o que for, essa energia, ao invés de mandá-la, perdê-la nessa materialidade, tentar algo dela que flua de volta e ver, com o tempo, o que é possível fazer novamente.

descobri, relembrando, que respirar é viver.

respiro.

um beijo!

4 de maio de 2008

desanuvia

às vezes a sobriedade é uma benção. e às vezes agradeço. como ser grato pelo que perco. como não contabilizar em ganhos - mesmo os ocultos -, não discorrer em danos. a sobriedade, mesmo momentânea... é um alívio.

2 de maio de 2008

Um mundo gira
na minha barriga
e me rodopia
me agarro
em meus marcos
me prendo de medo
me medo
endo-
Pedro

alavanca
a força tangente
me espanta
mas não há saída
senão que me perca
fugitivo de mim
pelo campo

me espanto
como quem toca boiada
sem cavalo

azar
vou romper
o cerco
tapo buracos com cigarros
preciso de ajuda
para silêncios
suspiros
e solturas
debaixo do diafragma
não basta
precisar de clausuras
para me debater
preciso escorrer
deixar de ser
de humano, basta
há de surgir
em mim
um humano gato
ou, quem sabe
um humano árvore

30 de abril de 2008

A luz emana pelas brechas
É dos furos, dos rompimentos
do meio dos escombros
que o calor arromba
abraça
Não é a desgraça
que faz frutos
doces
É o espaço

26 de abril de 2008

das fadas de élice

pra Lica

palavra é bicho travesso
e eu peço, em palavra de pensamento
que palavra
não falte
não baste
não tanto arraste
não tanto apronte
não dure
mas fure
e faça passar
o palavrear
solto
brusco
gosto
rosto
bem pelo meio
do discurso

25 de abril de 2008

Matéria Humana

As marcas eu perco às pancadas. As ferrugens saem aos solavancos. À lente polida, resta ainda um destampido de vista.

Em um segundo a imagem se impõe. É só de um segundo que precisa. Microssegundo sem reação, um centésimo de distância da fagulha e o fósforo não irrompe.

É bem rápido mesmo que rio vira pedra. E demora tempo para perceber que dureza é gelo e que também derrete.

Tempo e calor. Como fósforo.

24 de abril de 2008

Um avassalado de idéias, em dois tempos

2 semanas atrás

Me dói a barriga de idéias
Me tremem as pernas
Entortam meu pescoço
Tapam meus olhos
e minha boca
fica cheia
de vaziedades

Até que suo
até que as suo
e então
talvez
meu corpo vá ser só

e eu
consiga ser eu
um pouco mais


---
ontem

A chuva molha minhas idéias
Deixo que as lave da cabeça aos pés
Peço que as leve
(e com elas as imagens)
Peço que me leve
(e relaxo)
Leve meus pedaços
Me lave
E
inteiro
me deixe

17 de abril de 2008

Sunshine

tenho dançado comigo mesmo,
uma música que canto por aí.

bem bom andar nesses dias.

13 de abril de 2008

o dia chove aliviado. e embarco.

mergulho o suspiro da chuva. detrás das núvens, brilha um solzinho dentro de mim.

coisa boa de quem dança: além do passo,
aproveitar abraço.

12 de abril de 2008

A palavra que eu não disse 2

A palavra que eu não disse tem nome. Mas é muda. Então só se apresenta com um meneio de cabeça, como aqueles homens sinistros de filmes antigos que, não bastasse o escuro, não tiram o chapéu.

A palavra que eu não disse mal tem forma - vai saber. Não tem cor - ou me deixa daltônico. Mas, impressionantemente... tem peso.

A palavra que eu não disse me persegue. E some no beco escuro quando corro atrás. Depois me acorda, com soluço ou batida acelerada.

Seu segredo... é que eu, no máximo, queria querer dizê-la. Mas seja lá o nome que tiver... seu segredo... é que a palavra que não disse ocoupa o lugar do meu medo.

11 de abril de 2008

A palavra que eu não disse 1

A palavra que eu não disse bateu no ponto em que nossa arestas se encontraram. Bateu e ficou lá, vibrando. Não dita, maldita, e nada claro se era claro que ela ali estava, ou qual era, ou o quê. E eu que achava que palavra não dita passava, ou perdida, ou quem sabe até mesmo ganha: achava que talvez palavra pudesse passar sem dizer; ou então fugia feito a vaca do poema de Quintana. Mas assim... a palavra que eu não disse não se foi. Fez-se presente e depois não tinha eu o que fazer com ela. Porque vibrava ali, justamente onde nossas arestas... e ele eu nem sei se percebia... e na aresta, não mexia... e o que eu podia fazer? A palavra que eu não disse... estava justamente... no lugar onde eu não sabia dizer...

7 de abril de 2008

Crash Test Dummy

Ganhei uma marca, quase morri. O avassalador da experiência me diferenciou. Não de outros, antes de mim mesmo. O avassalador da experiência me sacudiu. Desde as pontas de meus dedos, o pó que meus ossos vão ser um dia desentupiram meus poros. O avassalador da experiência me deslocou. De susto, de súbito; de tão grande, de tão sem nome; de ter me levado tão longe, e de jeito tão diferente do mesmo. O deslocamento pela via, o arrasto do carro para outra avenida, a parada amassada em frente a Igreja... nada foi por acaso. Mesmo se casual, é com isso que dou de mãos e caso. Assim como o aríete da família, feito de dedo acusador, resposta estabelecida, soco... Assim como eu mesmo, com todo jeito feito impossível, resgatando muito mais prontamente naquele momento qualquer percepção associada com lisergia, e que ali era só trauma de ocasião, que ali era só tentativa de prontidão, que ali era só realidade estendida, realidade perdida, e cada ilha de realidade conquistada e naufragada de um caos-mar... E como lidar; e como bordear tamanho avassaladoramento...

Bati meu carro, arrisquei meu corpo e outros. Não o perdi nem ninguém. Tampouco minha alma saiu para dar voltas... Mas minha alma cresceu. Dentro de meu corpo e além, para dentro e para fora... eram aqueles delírios, aquelas falhas de lógica (como folhas de um jornal que vôou ao vento), aquele desprocessamento... eram eles indícios de minha alma que suspirava? Que quem sabe quase se soltava?

Perdi meu carro, tremi meu corpo, expandi minha alma. E minha mente... não sei... Ganhei. e talvez, para mais de mim, e menos... tenha sido minha alma... que tenha me ganho.

30 de março de 2008

Escrever

Escrever é mergulhar. Viver um entre em mim, procurar calmo ou desesperado por algo em um poço onde normalmente tudo é indiferenciado e, ao mesmo tempo, pouco se mistura; muito menos que na procura, onde o caos se agita e tudo afunda ou flutua.

Escrever é muito mais do que definir, até pelo contrário: que tentar encontrar palavra nesse poço-em-mim é dar-me conta daquilo que parece pronto e já não está, assim como do que desde antes se mostra sem tempo (só “antes” ou “depois”), escapa; simplesmente não pode ser contido.

Escrever é deixar claro como nada mais que a única contenção possível (como aquela da letra que se amarra em outras) é a contenção que liberta, como um traço que mostra o quanto tudo que está fora transita para dentro quase livremente e é muito maior. Escrever é um sufoco! E ao mesmo tempo um grande suspiro, como aquele que amanseia o lobo (o louco) que vai viver mais do que a gente. Escrever é traçar destino, porque pouco faz para mais além de apontar caminho como quem já começa a trilhá-lo. Escrever é se fazer de ponte (e inevitavelmente parar no meio para ficar olhando o rio). Escrever é trabalho de molécula, armando fronteiras como quem cria membranas lipossolúveis, como quem cria peles e se arrepia imensamente nos toques – de júbilo, de medo. É que escrever, por último, é abismar-se.

(P.S.: com toda essa idéia profunda de escrita, falta dizer que é nesse traçado que a cobra morde o próprio rabo, e eu escrevendo sobre o escrever acabo entretido nesse texto tão clichê...)

2 de março de 2008

Mensageiro

percebo coisas nas outras pessoas. talvez seja só aquilo que me incomoda e aquilo que me admira. mas percebo seguidamente, e quero pensar que para além disso existe um algo de vocação.

uma vez descobri que vim ao mundo para ser um mensageiro. e não é que eu entenda a mensagem... é que percebo. como se houvesse algo para além de mim em fazer ponte entre as pessoas e suas possibilidades...

e eu mesmo... tanto o que aprender com mensagens! mensagens minhas e dos outros... porque tenho me sentido (e graças a uma mensageira em especial) com uma amarra forte a me circundar, para que as coisas que eu escuto sejam envolvidas em meu próprio orgulho de descrevê-las. é peso de controle... e tento superá-lo deixando-me ir, tal qual cartaz que já espalhei por aí: "deixe-se ir..." eita.

quando percebo, nem sempre digo as coisas. nem sempre faço função de mensageiro. e, mais do que pela mensagem em si, é por mim que não digo... talvez pela sensação de que dizer também o seria. o mais difícil talvez seja isso... que os mensageiros em uma guerra não são responsáveis pelas mensagens que carregam... ou melhor, talvez até o sejam, porque arcam com seus resultados e tantas vezes são atirados nos poços... mas, mesmo assim, elas não os dizem respeito.

o bom mensageiro tem responsabilidade porque é capaz de dar uma resposta a altura daquilo que gera. e mesmo assim tais resultados não lhes dizem respeito. o mensageiro só tem rosto pra passar a mensagem, e não um orgulho que faça esse rosto de mensagem retornar sobre ele mesmo. o mensageiro verdadeiro é como um monge zen.

e eu não o sou. talvez tenha essa vocação de fato, mas também tenho orgulho pra falar por mim e amarrar as coisas ao meu redor. tal como o contrário: "o Sr. da Dança circula sem cair na confusão". e eu não.

dizer ou não uma mensagem passa a ser questão de escolha. e é uma escolha delicada... porque quem sou eu para dizer a qualquer um que tal coisa se dá, se é que se dá; que tal coisa é sentida? quem sou eu para uma ação no sentido de mudar alguém? deixar-se ir é também deixar ir...

as coisas que me admiram e as coisas que me incomodam em outro momento batem em minhas arestas. e aí uma mensagem não sai mais além de mim, mas totalmente minha. e é assim também, ter um rosto e um corpo no mundo, ter amarras, estar com pessoas, fazer contratos... ter relações. é assim e não há como se precaver disso, nem porquê... a menos que as mensagens saiam por si, através de mim. e talvez esteja aí o mais saudável energéticamente, o que menos disperdiça... mas e meu orgulho? e estar se impondo sobre as pessoas?

talvez não dê pra entender nada dessa entrada "Querido Diário". não é?

faz o quê. eu sim caio em confusão.

hum. tenho que sair é pra dançar...

beijos.

29 de fevereiro de 2008

devagar

às vezes precisamos de um tempo. é que às vezes é como se o tempo precisasse da gente...

questão para pensar...

25 de fevereiro de 2008

17 de fevereiro de 2008

bobo

olhaí meu bem
prudência e dinheiro no bolso
canja de galinha
só faz mal
à galinha

14 de fevereiro de 2008

pés descalços

tem pessoas que pisam nas plantas na beira da trilha. outras põe seus pés por debaixo delas, atrás das pequenas sombras.

de qualquer forma, todos nós nos queimamos na areia quente.

e os pés, que não tem rosto pra serem rabugentos, sempre agradecem à experiência. mas só quando chega água gelada do mar...

19 de janeiro de 2008

desde meu prelo, desde a porta aberta em despontada máscara, desde a cara que ainda persiste, resiste brava frente a enxurrada, desde a dor da ordenância, a falta de chão, a peça sublime de drama, desde a pessoalidade e todas as esquinas da alma, desde a palma batida, as palmas ouvidas, os vaios, desde os desmaios, os galantes em volta das tranças de Rapunzel, desde o mergulho do céu, da chuva que batia, desde depois do cerco, do erro, do berro, desde já, desde lá, desde depois daqui,


nem teu,
nem meu,
serei eu.