30 de abril de 2008

A luz emana pelas brechas
É dos furos, dos rompimentos
do meio dos escombros
que o calor arromba
abraça
Não é a desgraça
que faz frutos
doces
É o espaço

26 de abril de 2008

das fadas de élice

pra Lica

palavra é bicho travesso
e eu peço, em palavra de pensamento
que palavra
não falte
não baste
não tanto arraste
não tanto apronte
não dure
mas fure
e faça passar
o palavrear
solto
brusco
gosto
rosto
bem pelo meio
do discurso

25 de abril de 2008

Matéria Humana

As marcas eu perco às pancadas. As ferrugens saem aos solavancos. À lente polida, resta ainda um destampido de vista.

Em um segundo a imagem se impõe. É só de um segundo que precisa. Microssegundo sem reação, um centésimo de distância da fagulha e o fósforo não irrompe.

É bem rápido mesmo que rio vira pedra. E demora tempo para perceber que dureza é gelo e que também derrete.

Tempo e calor. Como fósforo.

24 de abril de 2008

Um avassalado de idéias, em dois tempos

2 semanas atrás

Me dói a barriga de idéias
Me tremem as pernas
Entortam meu pescoço
Tapam meus olhos
e minha boca
fica cheia
de vaziedades

Até que suo
até que as suo
e então
talvez
meu corpo vá ser só

e eu
consiga ser eu
um pouco mais


---
ontem

A chuva molha minhas idéias
Deixo que as lave da cabeça aos pés
Peço que as leve
(e com elas as imagens)
Peço que me leve
(e relaxo)
Leve meus pedaços
Me lave
E
inteiro
me deixe

17 de abril de 2008

Sunshine

tenho dançado comigo mesmo,
uma música que canto por aí.

bem bom andar nesses dias.

13 de abril de 2008

o dia chove aliviado. e embarco.

mergulho o suspiro da chuva. detrás das núvens, brilha um solzinho dentro de mim.

coisa boa de quem dança: além do passo,
aproveitar abraço.

12 de abril de 2008

A palavra que eu não disse 2

A palavra que eu não disse tem nome. Mas é muda. Então só se apresenta com um meneio de cabeça, como aqueles homens sinistros de filmes antigos que, não bastasse o escuro, não tiram o chapéu.

A palavra que eu não disse mal tem forma - vai saber. Não tem cor - ou me deixa daltônico. Mas, impressionantemente... tem peso.

A palavra que eu não disse me persegue. E some no beco escuro quando corro atrás. Depois me acorda, com soluço ou batida acelerada.

Seu segredo... é que eu, no máximo, queria querer dizê-la. Mas seja lá o nome que tiver... seu segredo... é que a palavra que não disse ocoupa o lugar do meu medo.

11 de abril de 2008

A palavra que eu não disse 1

A palavra que eu não disse bateu no ponto em que nossa arestas se encontraram. Bateu e ficou lá, vibrando. Não dita, maldita, e nada claro se era claro que ela ali estava, ou qual era, ou o quê. E eu que achava que palavra não dita passava, ou perdida, ou quem sabe até mesmo ganha: achava que talvez palavra pudesse passar sem dizer; ou então fugia feito a vaca do poema de Quintana. Mas assim... a palavra que eu não disse não se foi. Fez-se presente e depois não tinha eu o que fazer com ela. Porque vibrava ali, justamente onde nossas arestas... e ele eu nem sei se percebia... e na aresta, não mexia... e o que eu podia fazer? A palavra que eu não disse... estava justamente... no lugar onde eu não sabia dizer...

7 de abril de 2008

Crash Test Dummy

Ganhei uma marca, quase morri. O avassalador da experiência me diferenciou. Não de outros, antes de mim mesmo. O avassalador da experiência me sacudiu. Desde as pontas de meus dedos, o pó que meus ossos vão ser um dia desentupiram meus poros. O avassalador da experiência me deslocou. De susto, de súbito; de tão grande, de tão sem nome; de ter me levado tão longe, e de jeito tão diferente do mesmo. O deslocamento pela via, o arrasto do carro para outra avenida, a parada amassada em frente a Igreja... nada foi por acaso. Mesmo se casual, é com isso que dou de mãos e caso. Assim como o aríete da família, feito de dedo acusador, resposta estabelecida, soco... Assim como eu mesmo, com todo jeito feito impossível, resgatando muito mais prontamente naquele momento qualquer percepção associada com lisergia, e que ali era só trauma de ocasião, que ali era só tentativa de prontidão, que ali era só realidade estendida, realidade perdida, e cada ilha de realidade conquistada e naufragada de um caos-mar... E como lidar; e como bordear tamanho avassaladoramento...

Bati meu carro, arrisquei meu corpo e outros. Não o perdi nem ninguém. Tampouco minha alma saiu para dar voltas... Mas minha alma cresceu. Dentro de meu corpo e além, para dentro e para fora... eram aqueles delírios, aquelas falhas de lógica (como folhas de um jornal que vôou ao vento), aquele desprocessamento... eram eles indícios de minha alma que suspirava? Que quem sabe quase se soltava?

Perdi meu carro, tremi meu corpo, expandi minha alma. E minha mente... não sei... Ganhei. e talvez, para mais de mim, e menos... tenha sido minha alma... que tenha me ganho.