4 de dezembro de 2009

das teclas da máquina

Meu corpo
em surto
saúda toda
atividade
que em verdade
não há vida
nem infinita
nem inversa
sem essa perversa
dádiva do tempo
que faz em mim
nessa localidade
toda sorte
de movimento

29 de novembro de 2009

Bandeira Branca

bate um vento
fico a deriva que nem
bandeira sem mastro

bandeira sem cor
ou forma
defende o quê?
da onde?

"bandeira branca,
amor"

...
seja lá
saravá
vou astear essa aí no ar
e defender é o vento...

28 de novembro de 2009

o vento bate nas árvores
e meu coração solavanca
o cheiro de água no ar
já me enche da melodia da chuva
amo o mundo

escuto
sinto
há toda essa sinfonia sensível
e toda uma melancolia de memórias

algo em mim constantemente se rasga
é estranho observá-lo
há sempre essa dança
entre o que ao se perder se acha
ao se entregar vira outra coisa
e isso que fica
chamando nomes
contando histórias

amo o mundo
e me amo nele
até mesmo os rasgões
amo-os

me perco na contemplação
dessa infinidade

21 de novembro de 2009

Um Auto Perseguido

tomo um susto me lendo!

um susto me temendo
me deglutindo
me gostando

um susto perdido
de querência de mim mesmo
esse eu que não sei quem é
e às vezes
as palavras
vem a me apresentar

ando correndo atrás
de um eu
que me escapa...

20 de novembro de 2009

ideias vagas

o tema do morro é o esporro.

a única coisa que impede o encontro
é o medo
(ou a falta de oportunidade
mas essa última
não conta
no encontro
consigo mesmo)

5 de novembro de 2009

Já vi o mundo em cima das costas de um camelo

O levava quieto
pensativo
O levava lento

Mas era de corpo tão acostumado
que ia
como se não
pesasse

18 de outubro de 2009

circula o céu nos meus
--olhos

abraço a terra
com meus pés

chora a madrugada
-----não nascida
pelos meus poros acordados

a madrugada a abraça
------------e a mim
através das árvores
que
----em silhueta
nos
--circundam

8 de outubro de 2009

na porta da geladeira

éramos obscuridad
mi mano contigo hierve
sobre tu labio
escribe dulce
la muerte

22 de setembro de 2009

pôr do dia 20

um risco fino se aproxima do horizonte
e queima cada vez mais vermelho fogo
diamante alaranjado que as brumas da cidade logo englobam.

risco de Meia-Lua
virada pra cima.
só depois da barriga ter desaparecido
suas pontas somem.

risco fino de Meia-Lua.
ela é a Rainha da forma.
não há metáfora possível.

13 de setembro de 2009

bola de vida

fiquei pensando nos gatos que pulam as janelas das cozinhas dos filmes, caem suavemente pelo canto da tela, dão um miado singelo, simpático, bebem o leite deixado com compaixão pela protagonista como uma agilidade morna, como se ali para mostrar uma voracidade com a paixão excluída, e então somem.

olhava pro meu gato, entrando na cozinha dos meus avós com miados insistentes, cheio de si, uma voracidade apaixonante-chata de carência em toda sua cara de "nem-ligo". essa sinceridade de gato sabendo o que quer. essa grande bola de vida pulsando que é esse gato - que é a situação.

fiquei pensando em como nos apresentam a vida em detalhes... mornos. uma brincadeira de imagens estereotipáveis, provavelmente gostosas assim mesmo, algo do que rimos, o canto da tela ou tudo nela.

e olhava pra vida e pensava como ela é detalhadamente imprevisível, cada momentinho dela.

10 de setembro de 2009

corporal plane

ando dormindo nas sombras em mim.
mergulho em escuros procurando travesseiros,
cobertores,
como quem foge do vento frio.

o vento frio corta dores
e não é difícil encontrar a necessidade de que pare de doer
quando tomo as dores como minhas.

mas é difícil, muito difícil
as dores de tomá-las
quando percebo que há cortes
não onde as dores ardem
mas lá onde há a necessidade
de se mover quanto a elas.

me enrolo no análise
na poesia de tentar expressar um só mergulho.
as sombras tomadas tapam em ilusões de calor.
constantemente me envolvo nelas
constantemente desperto.
há uma luz que também provoca sombras.
há a possibilidade de respirar no escuro
quando se olha pela pele.

será que os cachorros sonham?, me pergunta ela.
do que são feitos os sonhos?

sou eu.

não tenho grandes pequisas quanto aos sonhos.
então, quando se mostram,
sempre me surpreendem.

3 de setembro de 2009

um teatro

o coração viaja
em uma dança
espiada
sentida
de corpo reverberante
de corpo sensível
epiderme estendida àquilo que o olho vê

o corpo conversa
o olhar no escuro do retorno

no escuro
não tem como saber o olhar que conecta
o coração é esperança de contato
o coração
maravilhoso coitado
suspira a poesia
do movimento

alguma coisa absurda
pede um cigarro

26 de agosto de 2009

uma Luz vai dormir
a noite passou festivamente rápida
por debaixo de mim
asfalto correndo
o vento
uma batida por pedalada

ufa!

êia glória.

8 de agosto de 2009

um post bobo

tem dias que quero dormir com todo mundo.

não me refiro a transar com todo mundo.
também sei que todo mundo não diz muito. dá essa vontade de todo mundo, todo um mundo feito de pessoas queridas. o que também não ajuda muito na descrição concreta, mas acho que diz alguma coisa da intensão.

sei lá. é só isso. tem dias que dá vontade de mergulhar em carinhos com gente bacana. e que dá gosto de ter tanta gente bacana em volta...

queria uma cama beeem grande, e nenhuma idéia entre a proposta e o carinho.

"uma vida, uma viagem, com ele sempre é mais."

24 de julho de 2009

Vem o silêncio
manso
pede passagem
como a aurora
e se instaura
como um abraço
dado
em meio
ao sono

23 de julho de 2009

Descalço no Parque

Gira manso
meu pobre pé
descalço
gira debaixo de mim
e me leva
eu
sem saber onde estou

Olho deslumbrado
a procura
da aurora
de algum
significado

Não há
só o bater do meu pé
ritmado
ondulando
o bater
do meu
coração

22 de julho de 2009

De uma companhia

Dói mais que a alcova
e menos que a morte
Essa pequena dor serena
insistente e inexplicável
essa dor de vida
que vem companheira
e o que fazer
se a companhia
cativa?

21 de julho de 2009

Acordei em ensejo
Acordei em devaneios
Acordei em desesperos
de muitas coisas
deixadas
de ontem
Acordei em acordes dissonantes
vários
tocados ao mesmo tempo
Acordei em sono
Acordei procurando
o sorriso

Acordei
e já dormia

19 de julho de 2009

Pedaços

Não foi da desforra
que a mente
fez a glória

porque a mente
acorda bêbada
quando a gente
acorda

Não foi a lamúria
tampouco
nem da luxúria
ou sobriedade

a mente não conhece
sobriedade
até ser entorpecida
em corpo

até ser esticada
até a presença
sufocada
de lamentos
enxurrada
de suas despensas

a mente saiu
foi passear
fiquei deitado
e me perdi
nos milhões de corpos fragmentados
que me atrevo
a ter

a mente riu
boba
quando virou criança
e, sendo eu adulto
nem precisava responder pelo tanto
o corpo sabe
ser um só
como a mente
sabe ser corpo
só precisa
esquecer da mentira
que faz um agora sempre de ontem
só precisa
desfazer o véu
e lembrar

O pulo do gato
não faz
ressalvas

18 de julho de 2009

Fim

perdi a hora
vambora
não tem limites
esse sofá

perdi a bomba
que foi
que fez
com que tu te mexesse
tanto?

perdi a perda
tava tudo igual
no samba
foi só no estômago
que senti
que as passadas
se arrastavam

12 de julho de 2009

em dúvida
divido
angústia
com meu silo
meu umbigo
minha questão

e então
soluça
esse jeito
de intempério

gosto
de como
teclo
deslizando dedos

gosto de como penso
pensamentos carinhosos
até serem
mergulhados
na cólera

21 de junho de 2009

o dia começa
em medo de término
me refugio nessa continuidade
louco
louca eventualidade
que me faz aqui
que me faz
queime
um medo
queima
esquema
esquerdo

em um dia acompanhado
não há nada
que dê escondeirijo
quando a solidão
é possível
e o coração
ainda assim
acha companhia

18 de junho de 2009

fragMundo

O mundo parece louco e perdido. O mundo parece fragmentos autônomos conectados por linhas finas, tênues, frágeis. Linhas de quê? Afetos... histórias... apegos... não faço idéia.

Um mundo de pedaços.
Parece fazer sentido.
Que mistério indescritível
dar conta disso
quando é impossível
que
se

conta.

10 de junho de 2009

a luz apaga
é passada a hora
o filme fica preso
dentro do peito
vira companheiro de densidades
uma vida externa a carregar comigo
mais uma, ao menos
eu e minhas muitas vidas
a serem carregadas

toca no computador
"venho pra levar
os amores que fiz nessa vida"
são minhas palavras, mesmo não sendo
meu coração as dá para mim

não parece haver nada
mais legítimo
que isso

(referências: Donnie Darko, Os The Darma Lóvers)

5 de junho de 2009

Réquiem de Sexta-Feira

toda hora
embora
um fluido
vaza
enchendo
algum receptáculo
seja o balde
ou o mundo

esbarro no muro
do fim do dia
a euforia
se foi de mim

fico
nesse estado cheio
meio frágil

há uma doçura em tudo
há espaço no balde
quando o mundo traga o líquido
e no líquido
quando se agita de ar

há uma doçura também no fim do dia
nessa melancolia
na solidão
deixada
pela falta da busca
de companhia

há doçura também
no vai passar
mas durante
o passo
não há nada

ar, talvez
um balde cheio de vazios

espio
o umbigo
às vezes sinto ele o mundo
às vezes só

suspiro
o dia chega em noite
passa ela
noite
moça imaginada
eletrola de uma dança
hoje não dançada

passarela
passo eu
janela do umbigo
perdido
senão ferido
nessa carênciazinha
que se faz longe

cheio de vazios
ao longe
não tem fim em pequenezas

suspiro
há doçura em tudo
e um gosto enorme
em se aninhar nas próprias
cobertas

29 de maio de 2009

Meio bobos

Todo encontro
tem um calor
de inegável sexualidade
Está aqui
e canta

Somos meio bobos
enquanto poderíamos
ser bobos completos
pra dançar esse canto
ou, pelo menos,
com ele ficar feliz de verdade.

Mas somos meio bobos.
Entendemos o canto
no que há de estridente
como grito

Entendemos o canto
no que há de feio
de direto
cortante
de presente
faiscante
de rebuliçante
de estrondoso
de incerto
certeza
de avassalado
quebradiço
suave
exposto
claro
absurdo
quente
quente

Entendemos o canto.

E como idéia
não ouve
tapamos
os ouvidos.

Morre, canto
em idéia
corpo
não dança...

28 de maio de 2009

Me ocorre agora
que vou chegar da onde saí
e é por ti
corpo
que euspírito

26 de maio de 2009

27 Outonos

bate um vento
o dia abriu em Sol
meu coração tem uma felicidade serena
é isso
27 Outonos
a vida não se conta
mas a gente teima
e às vezes
quando a gente conta
a vida vibra
que a gente sente...

25 de maio de 2009

Na língua no céu da boca

tudo se mistura, em uma vida cheia de contágios
tudo se mistura, quando a pele se abre em poros de intensidade
quando encontros tomam contato
quando contamos mas nos perdemos e misturamos no errar o número
tudo se mistura

páro
verifico
o pneu cheio é parte alívio
parte orgulho ferido
de estar mesmo sem fôlego

tudo se mistura
entre encontros
e flutuares

asfalto passando rápido
ora moto na estrada
ora a bicicleta traduz a cidade em alguma diversão de fluxo

me misturo
solavancos solenes
gostos no céu da boca de memórias
cheiros de futuros desde passados

me misturo
com tudo
e tudo se mistura
de novo

misturado
assumo

não tem fim
esse poema

13 de maio de 2009

Minha cabeça
traça fio sem metáfora
A idéia me perde
Sonho em dia
e imerso
não dissocio
vida e poesia
vida e dor
vida e eu
imensidades...
Traço fio
trago fraco
vazio
Um frio
e eu
esguio
sem dor em dor
sem dó
escorro, escolho
encolho
perco a linha da peça
o silêncio
me poesia

10 de maio de 2009

certo Dormingo

levo pedaços de pessoas comigo. por vezes, dói. pessoas precisam de significados para serem levadas. pessoas tem significado, passado pra mim via pele aberta, via corpo às vezes aberto demais. pedaços, porque difícil é levar pessoas inteiras, porque os tempos se impõem de maneira severa, porque tudo rui a cada partida e o ruir é ressentido quando não desapego, quando ainda espero, quando me prendo um tanto e acabo não presente na fluidez que também me marca.

pedaços tem pontas. pontas de significado que ficam pinicanicando.

acordo enredado em sentimentos. um pouco difícil sentir. e isso é tão bobo que não sei explicar. como estar sofrendo com o que se gosta de ser.

o gostar sendo descrição, discurso não basta. e dá raiva a imensidade disso.

hora de pedir socorro. um tempo em choro, lamento, drama. acesso a genuidade. respiros, sempre os amados respiros. e sono. quando der pra dormir.

um fechamento-consolo, abraço em si mesmo. quando falta carinho, acha-se um carinho interno. quando me dou esse tempo. acaricio a mim mesmo. me consolo. um pouco triste fazer isso sozinho, tanto quanto também é maravilhoso. (talvez seja sempre um auto-carinho, que a gente tem que permitir o carinho alheio, que a gente sente ele e nosso sentir é nosso.)

respiro, amado suspiro. vamos de novo. detrás, sempre tem um sorriso compassivo, quando se chega a ele.

quando se chega a ele.

22 de abril de 2009

sobe pela minha cabeça sem tempo
uma poesia solta
travessa e avessa as idéias loucas
de todo cotidiano qualquer

sobe pela minha cabeça
sobre
e meu corpo
dormente
sai pra passear
encontrar uma coisa doida
que não seja doída
e se faça de comida
pra espírito

como e me lambuzo
e sorrio
saio
de tudo
corro por aí

mesmo no meio da cidade
tenho o vento
por companhia

17 de março de 2009

Ontem

Nessa manhã não usei despertador. O programei para mais tarde, dada a hora em que estava indo dormir, mas acabei acordando a meio caminho entre o tarde e o cedo.

Agora, apesar da minha persistência em ter vontade de ler, o sono vem como um desconforto em tudo. Demoro para percebê-lo.

E por algum motivo achei que deveria anotá-lo.

É estranha essa raça humana.

8 de março de 2009

Meditação

Minha vontade é como um espírito errante e disperso.

Meu espírito flutuante. Se joga para um lado e outro, vagueia certo por só um momento, lambe objetos e outras coisas como as labaredas de um fogo. Meu espírito errante, dispersamente... mostrando o quão difuso me arranjo, quão serpenteante e perdida fica minha energia, quão indomável e desarticuladas são as minhas partes.

Atenção no Centro, de novo. Comecemos mais uma vez.

20 de fevereiro de 2009

51%

Do centro tempestuoso de um momento de solidão, meu espírito me disse: "enquanto tu tiver estrada para pegar por ti mesmo e a chance de tua própria convivência, tudo estará bem."

É tão contrário a uma boa resposta à solidão... mas eu acreditei. Porque há uma sensação nisso tudo... Uma sensação-mundo, uma sensação sem muro, um encontro comigo mesmo. Com toda a saudade que existe. Com todas as pessoas que eu amo, que é o que levo dessa vida, nessa vida.

E nisso... nisso eu posso me segurar.

15 de fevereiro de 2009

Leitor

Um livro tem vida. É quase uma entidade. Te abraça, te chama, te repudia. E a relação com ele fica chata, excitante, curiosa.

Um livro é vida. Vida condensada, investida, pulsante. E quando se chega nesse nível só resta bebê-lo, tragá-lo, se nutrir da vida que há nele, quase autônoma a nossa, cheia de energia.

É assim que leio. E quando finalmente acesso a vida que é o livro, ela me rodeia. E eu mergulho.

12 de fevereiro de 2009

eu medito e percebo que tenho uma outra respiração, menor e mais ampla, e eternamente mais serena, por debaixo da minha respiração normal. e percebo que minha respiração "normal" é cheia de controle nervoso ou algo assim e como que barra essa outra.

eu medito para encontrar minha calma interior. é esse meu desafio agora.

8 de fevereiro de 2009

On the Road

Até as coisas tortas tem sua certeza. Esteja onde esteja.

Não sei como faço essa viagem, mas não questiono. Sigo ou fico. Nunca estaria aqui se não fosse assim.

Tem momentos da estrada que tudo é tão imenso e maravilhoso que tenho vontade de chorar. E às vezes choro mesmo.

Amo muito o mundo.

6 de fevereiro de 2009

5 de fevereiro de 2009

instruções para um satori

1 - leia "os vagabundos iluminados";
2 - saia para viajar de moto com barraca, leve "zen e a arte de manutenção de motocicletas";
3 - amarre bem suas coisas; relaxe bem os ombros e o corpo, de novo e de novo;
4 - diminua antes das curvas, acelere quando dentro delas;
5 - leve um mapa; prefira rotas alternativas, mas pergunte sempre;
6 - leve comida inteligente e boa, coma pouco mas muito bem;
7 - seja amigável; abra-se para a amigabilidade das pessoas; respeite-as quando não o forem;
8 - abra-se para a paisagem, mas sinta a estrada; sinta a moto;
9 - medite, reze e/ou fique em silêncio pelo menos 2 vezes ao dia;
10 - cuide-se bem;
11 - aprecie, aprecie, aprecie!

3 de fevereiro de 2009

curvas de nível e final de livros

ontem a noite chorei algumas vezes lendo "Os Vagabundos Iluminados" que em algum momento de suas páginas me tomou por completo como achei que fosse mas já tinha me esquecido até acontecer.

uma hora bate essa tristeza, essa tristeza amiga, já conhecida, essa tristeza melancólica parecida com a de final de tarde de Domingo - só que tristeza de viagem, de andança, de distância. tristeza de vida. de poder realmente abraçar o mundo, mas haja braço e haja tempo, portanto tristeza de quem se sabe abraçando o mundo aos poucos.

vou cantar e rezar e meditar e dançar e agradecer pelo mundo todo.

"é, as pessoas boas ficam no Céu, elas já estavam no Céu desde o começo", disse o caminhoneiro sábio à Ray.

28 de janeiro de 2009

estou entre mundos.

e os mundos, às vezes, parece que quebram...

20 de janeiro de 2009

loucos esses tempos em que danço tão pouco
mesmo sendo mentira
danço um suspiro que falta
pro balanço da levada da vida
e haja vida
nesse banco
novo de praça
que eu traço
ou espero traçar
numa manhã de domingo
deitado
sem ressaca
mas com sono

loucos esses tempos em que danço tão pouco
que dentro de mim
antes da música
vem uma tristeza súbita
não sei da onde nem do porquê

loucos esses tempos

mas o passo
já anuncia
que não vai ter certeza
e só no rebolado
achará seu gosto
e depois disso
ninguém
segura
sinceramente

14 de janeiro de 2009

nesse momento de loucura, meu espírito vagueia atrás de um rumo no meio da tempestade. mas vai em frente, sempre em frente. fareja o ar, que é com o cheiro que os espíritos se encontram. ou com as vibrações do mundo. fareja o ar revolto... e segue.

12 de janeiro de 2009

Nenhuma tampa de panela

Como começar? Sempre uma questão pertinente. Suficiente para que se busque de novo e de novo, início, re-início, onde, aqui, agora. Como começar... E o fato incrível, mesmo que inegável, de que se começa.

Talvez haja essa necessidade natural-humana de extremos. A busca constante pelos limites da curva. A questão que cotidianamente se apresenta, como resistência ao cotidiano: como estar seguro na montanha da curva normal e ao mesmo tempo orbitar seus extremos. Como assegurar-se na normalidade e aproveitar do extraordinário.

Uma questão para inquietos, por certo. E quem não é inquieto na velocidade aparentemente irrefreável da sociedade "pós-moderna"? Uma inquietude posta já a princípio, uma inquietude de início, fundante do dia-a-dia dos sujeitos. Uma inquietude que antecipa a oferta, a oferta constante do nosso sistema, "sociedade". Já pensaram sobre essa palavra, "sociedade"? Somos sócios de quê, exatamente? Sócios desse ofertamento, desse oferecimento incessante da solução impossível?

Mas inquietos. Talvez os que conseguem fazer algo disso. Porque talvez pra maioria seja "inquietos com escapismos". Faltantes que buscam tampas de panelas.

Inquietos. Como começar? De resto, pro resto, talvez não importe, desde que comece y asi va. Encaixe em qualquer coisa.

Assim, qualquer dúvida sobre início implica necessariamente em uma dúvida sobre um final. Como começa - com termina? Como terminar? Como, final?

Buscar os extremos da curva. Buscar uma orbitância pra vida cotidiana. A busca. Marcos instáveis, graça, gosto, gozo. Vamos lá, da inquietude alguma coisa nada singela, não tampa de panela, alguma coisa a mais que dê para levar.

Dar conta da orbitância, então. Dar conta do sujeito ordinário em si, daquela velha necessidade do ancoramento no centro da curva, no grande monte populacional ordinário. Dar conta da orbitância. Da vertigem, do solavanco. Da curva a 150km por hora.

O Abismo sem socorro, porque presente. Do buraco da falta, mergulho.

Como começar. Como terminar. Milhões de inícios e términos feitos fuga, feitos solução ousada, solução insolucionável, solução com todo o âmago da frustração acoplada. Na falta, nenhuma tampa de panela, mamãe.

5 de janeiro de 2009

Conspiração contra a Mudança

É difícil mudar. Muito difícil. Doloroso e angustiante. Primeiro, porque a ousadia de mudar-se a si mesmo envolve cortejar a morte. Na mudança, uma parte de nós perece; um modo de sermos nós mesmos entra em colapso. Segundo, porque enfrentamos a resistência organizada das instituições e a oposição ferrenha de todo mundo que nos cerca. Unem-se numa brigada contra a mudança aqueles que, de uma forma ou de outra, nos conhecem, dão testemunho de nossa biografia e zelam pela imutabilidade.

Engana-se quem imagina que contará com o apoio alheio ao projeto de transformar-se, mesmo que a mudança seja um imperativo social e um desejo coletivo. Equivoca-se o sonhador ingênuo que espera estímulo à mudança por parte das instituições supostamente destinadas a promovê-la, por paradoxal que pareça. Este é o fato: há uma conspiração pela fixação de identidades e pelo congelamento de suas respectivas qualificações, especialmente se tais qualificações forem estigmatizantes. Mas a pior notícia é a seguinte: nós tomamos parte da conspiração; participamos e contribuímos para a blindagem ontológica que coagula a história e engessa processos biográficos.

Luiz Eduardo Soares, "Cabeça de Porco"