31 de agosto de 2006

Lado de dentro

Meu sangue anda grosso. De levado pele adentro, as veias carregam muito. Pesado um pouco, sono.

Tem um deserto dentro de mim. Tento enxergar: poeira alta de tempestades dançando por todo lado. Medito o que dá. Espero a chance de correr deserto dentro-fora, bater areia com os pés e fazer chover cheiro de terra molhada; virar vento e voar liberto, de um rápido sereno: gargalhada.

Tento enxergar. Fecho os olhos. Tudo um bom; tenho dormido sempre cansado.

Não entendo direito a tristeza que às vezes bate.

Suspiro de vontade.

Espero a chance.

30 de agosto de 2006

eu corpo

Meu corpo responde inédito
eu corpo
descoberto

Procuro nascente
de movimento
e acho
enquanto me foge

Me passa
me funde
me impressa

me explode

28 de agosto de 2006

Tambores Sobre o Dique

em um feudo no Japão antigo, está para vir um dilúvio. a única solução para evitar que todos os dqiues que protegem a cidade da fúria do rio é fazer com que um deles se rompa, acalmando sua força.

o senhor do feudo hesita entre suas opções. pode ordenar que rompam o dique sul e isso significaria que todo o bairro das artes sucumbiria, junto com as escolas e as bibliotecas. ou pode ordenar que seja o dique norte o destruído, e então o rio levaria todos os prédios que alimentam economicamente o feudo, construídos com a madeira das árvores cuja derrubada desenfreada causam o dilúvio.

há uma alternativa: abrir uma fenda nos diques que protegem os campos. mas o senhor feudal não quer ser lembrado pela história como o Senhor Kyu, que muitas décadas antes fez justamente isso, matando centenas de camponeses no meio da noite. os sobreviventes de então se revoltaram, atacando e destruindo a cidade...

essa é a história da peça da encenadora francesa Ariane Mnouchkine (Tambours sur la digue no original). escrita para o teatro de bonecos japonês, a montagem em questão (de 2002) traz atores interpretando os bonecos e atores como os manipuladores, criando uma linguagem simplesmente sensacional. além disso, a peça foi passada para a tela do cinema, e há um DVD que traz também o making of (se alguém encontrá-lo, por favor me avise).

me lembrei dessa história, que passou no Santander mais pro início do mês, lendo o jornal de hoje. é que semana passada estreiou em quatro episódios o documentário do Spike Lee sobre o evento do furacão Katrina em Nova Orleans. se chama When the Levees Broke. o filme, cuja tradução do título é Quando os Diques se Romperam, além de falar a respeito do racismo na escolha deliberada de não intervenção por parte do governo americano, que deixou a cidade sem água nem luz por 5 dias (e nas condições que se encontravam, a bem dizer), traz a tona uma hipótese já lançada por lá desde logo após o acontecido:

que talvez alguns dos diques tenham sido bombardeados, fazendo uma escolha por inundar as partes pobres da cidade, salvando as partes ricas.

sinistro.

24 de agosto de 2006

UmColetivoDeVida

a gente faz afeto abrir caminho.
onde o trampo, o grampo, a grana atravancam, a gente rasga.
incapturáveis!

(pro Iacã)

22 de agosto de 2006

Família

meu avô dá sustos com gritos ásperos e profundos, fala grosso, assobia, gargalha quando corre e faz absolutamente tudo o que os três pequenos mandam. virar criança é dizer pouco, encanta eles e a mim que como atrasado de horários outros.

o Sol entra pelas janelas de muito vidro, a lareira acesa empresta cheiros a casa inteira, o Guaíba está ali pra ser visto refletindo todo o frio que ainda resta ao ano - e que a gente não mede. nem pede que acabe seriamente.

come-se muito que a ordem é três refeições por uma, sobremesa incluída. fala-se alto (eu não lembrava). o café que era por minha conta tenho errado - no atraso já está pronto e fico com o segundo turno que sempre se faz necessário.

minha prima de três anos e meio diz que tem que aprender a amarrar os cadarços com meu vô porque só ele que sabe. e ele sabe. foi um pai duro de respeito e o avô mais doce que essa terra já viu. e ainda por cima é fechado de transbordar sentimentos pelos olhos cheios d´água e nem palavra a respeito que isso não deve existir não.

com todas as suas coisas, grandiosidades e pequenezas, mesquinharias e gargalhadas, e mesmo falando alto, esses aí são minha ilha e minha catapulta. se eu tivesse escolha, não os trocaria jamais!

Sinceridade

é muito bom olhar fundo nos olhos

20 de agosto de 2006

Sabadaço!

depois de papo do bom, de fácil de dizer, de muito rir, de bobalhices e tanta verdade no olho amizade:

turbulências, torvelinhos, temperaturas altas e baixas, rodopios e muita bebida.

as músicas repetiram e quem disse que eu notei?

a gente dança no aperto e não se importa quando finge que o pisão no pé não causou cara feia (foi de leve, ou costa a costas).

a gente dança.

é isso que importa.

adoro essa cidade com todas as suas pessoas!

19 de agosto de 2006

Citação de respeito


buscando
Originally uploaded by
ieve.

busca é essa guria tirando foto.

poesia em imagem. e se me sinto imagem, é assim que sinto.

status: 8e1/2%

Quinta foi uma noite de muita gente e pedaços. de desorganização em olás, de personagem, de dificuldade. de chamadas e pessagens (passagens + pesagens), de fluxos naturais na lei dos encontros, de hora perdida, hora ganha, hora atrasada. foi dia de estar em outra contagem, o mundo passar paralelo.

também foi dia de acordar mais um pouco. de desbloqueios de felicidade, sorrisos genuinos, de corpo que se aquece. de olhar o mundo novo, não o mesmo.

Quinta foi uma noite de olhos abertos incendiários.

(ontem, de abraços cobertores.)

descobri que rolar no chão ajuda a desanuviar a visão. um braço que não se dobra e mesmo assim faz de tudo fluidamente, é isso que vai me ajudar a estar nú no mundo e bem aquecido.

16 de agosto de 2006

Ando por onde andam

vejo palavras de quem está por aí e me bate uma certa irmandade de sentimentos; reconhecimento de vazios e cheiros de preenchimento, de mudanças, desvarios, devaneios.

aqui as coisas nesses dias me enchem. penso em tomar a agenda como prática, uma inédita em minha caneta e lápis. é louco, é novo, mas é bom ter coisas que me levem.

desde que leve. tento.

ontem escutei sobre a comodidade da proximidade, ou algo assim. é bom estar próximo quanto tanto se esperou. mas próximo pelo próximo...

demorei um dia pra ficar brabo com isso. falei na hora, como sempre, língua sonora. é o meu cômodo, acho. e não me encontro... é brabo.

parece que acordo. estou lento nos gestos, um jeito não me cabe, canso. de novo, ranso das minhas palavras.

ou vou morar de pernas cruzadas, Pedro em cima duma pedra, e a velha montanha um dia me abraça...

ah, até esse é um discurso velho. em que palavras sai meu espírito dançando?

preciso de música pra esse esqueleto. no Sábado, o Baiano me salvará.

(uma Ode aos despatriados!)

14 de agosto de 2006

Familiaridades

ando pela cidade e vejos rostos conhecidos. boa parte deles são pessoas que conheci no Rio. boa parte deles são rostos que a memória ou a vontade ou a fixação por uma familiaridade desenham por sobre os rostos desavisados de transeuntes incautos, cuja imagem perde tanta propriedade assim que a luz que deles vem incide sobre minha retina e toda a rede neural que dela se conecta e toda complexidade pessoal dos meus funcionamentos relaxados.

ando pela cidade e falo e escuto e sinto e penso e tudo o mais de indescrito. me assusto comigo vez que outra. expressão de fluxos que em mim tomam caminho. processo do inédito ao conhecido e demarcado, ou o contrário, eu espero e pago pra ver. quero um novo e mais, exijo, que o mesmo sorriso não comporta outros sorrires, quando o jeito de olhar está deslocado ou se faz em um deslocamento deliciosamente contínuo. about me: sou outro.

fotografo os cantos, os pontos, as curvas, os pedaços. tudo é ainda um turbilhão de tantas coisas, um sentar poeira que pede que não sejam antas coisas. fotografo num esforço bem pago, mas sei bem que um outro jeito seria também bem-vindo, agora impossível: flutuar por aí e deixar que as imagens, que os cantos, os pontos, as curvas, os pedaços, passem por mim e pela câmara, que fiquem na película ou no arquivo, e na minha pele de uma superfície de contato sempre a modificar-se, por favor.

tento. e já é bom. vai ficar melhor, corporificado. a permeabilidade da massa das minhas moléculoas, substancialidade presente, eu feito vento por mim a passar. e a cidade, um abraço.

folgo em sentir.

10 de agosto de 2006

Delícia!

Amigorama

onde eu entro às 3:00 eu encontro esses dois... eba!

será que nesse findi tem mais?

(olhem só, um post claro e pouco filosófico... é o amooooooor... hahahahahah)

Para um Sarau Erótico

Livre
da pele
sai solto
num grito
quase espanto
um sufoco
de alívio
em que se perde
se acha
e derrete
de si
um junto


gozo

No Silêncio

Jaz no silêncio
um julgamento que todos escutam
seu não proferimento
certa segurança de permanência

Jaz no silêncio
o afago que sentem nossos ossos
pelo íntimo sólido
da simples amiga companhia

Jaz no silêncio
todas as batidas da angústia
todas as solturas dos suspiros
todos os espaços das falas

Jaz no silêncio
os discursos incontidos, incautos
que só no silêncio
quando jazem as palavras
faz-se sentidos

Jazz no silêncio

Nossas almas dançam

8 de agosto de 2006

Um Novo

Esperava me encontrar aos pedaços pelos cantos, esquinas, lugares. Mas não. Se estilhaçado andava por aí, assim que o avião pousou já me atrai em todo, juntado no peito de vácuo.

A cidade não me deu tantas estranhezas quanto minha expectativa. Talvez eu ainda esteja chegando aos poucos e isso seja tudo. Ou o próprio funcionar absoluto que sai fácil, faz do meu um jeito avassalador de ser e não deixa muito buraco. Eu sentia falta de chão, por supuesto. Talvez seja isso...

Há coisas que saltaram aos olhos mesmo assim. O frio a me beijar os lábios - e então o primeiro calor do joelho pra baixo e a meia a me agarrar absurda os pés. Os táxis vermelhos. A existência das lotações. Coisas assim, quase bobas.

O tamanho do céu, o muito horizonte. As estrelas no meio das luzes das ruas. O quanto de verde, e morros pequenos ainda pelados ou cheios. Cheiros.

Achei que ia me encontrar pelos cantos. Descobri os cantos que sou eu. Vagueio por mim mesmo e me descubro novo, me refaço, me desnudo. Não sei, me acho inusitado, não me conheço. E se me caio num mesmo sorriso, quero o desfibrilamento, pra me achar de verdade no meio dos músculos de um mesmo ritmo.

Me ajuda a me criar?

Beijo