9 de novembro de 2004

Amor Louco (AL)

Na falta de inspiração ou tempo, resolvi reproduzir aqui um dos textos - mais - lindos do Hakim Bey e que não encontrei em português na íntegra na Internet ainda... (Retratando...) Só pra fazer um link, nesse texto ele me dá a forte e gostosa impressão de misturar seu anarquismo ontológico com Osho com Roberto Freire com Reich... enfim, deliciosos gozos libertários...


O AMOR LOUCO NÃO É uma social-democracia, não é um parlamentarismo a dois. As atas de suas reuniões secretas lidam com significados amplos, mas precisos demais para a prosa. Nem isso, nem aquilo - seu Livro & Emblemas treme em suas mãos.

Naturalmente, ele caga para os professores & para a polícia, mas também despreza os liberais & os ideólogos - não é um quarto limpo & bem iluminado. Um topógrafo embusteiro projetou seus corredores & seus parques abandonados, criou sua decoração de emboscada feita de tons pretos lustrosos & vermelhos maníacos membranosos.

Cada um de nós possui metade do mapa - como dois potentados renascentistas, definimos uma nova cultura com a nossa excomungada união de corpos, fusão de líquidos - as fronteiras imaginárias de nossa cidade-Estado se borram com o nosso suor.

O anarquismo ontológico nunca retornou de sua última viagem de pesca. Conquanto ninguém nos denuncie para o FBI, o CAOS não se importa nem um pouco com o futuro da civilização. O amor louco procria apenas por acidente - seu objetivo principal é engolir a Galáxia. Uma conspiração de transmutação.

Seu único interesse pela Família está na possibilidade do incesto ("Amplie o seu Eu!", "toda pessoa é um Faraó!") - Ó, mais sincero dos leitores, semelhante meu, meu irmão/irmã - & na masturbação de uma criança ele encontra, oculta (como uma caixa-surpresa japonesa com flores de papel), a imagem do esfarelamento do Estado.

As palavras pertencem àqueles que as usam apenas até que alguém as roube de volta. Os surrealistas se desgraçaram ao vender o amor louco para a máquina de sombras do Abstracionismo - a única coisa que procuraram em sua inconsciência foi o poder sobre os outros, & nisso foram seguidores de Sade (que queria "liberdade" apenas para que homens brancos & adultos pudessem estripar mulheres & crianças).

O amor louco é saturado de sua própria estética, enche-se até as bordas com a trajetória de seus próprios gestos, vive pelo relógio dos anjos, não é um destino adequado para comissário ou lojistas. Seu ego evapora-se com a mutabilidade do desejo, seu espírito comunal murcha em contato com o egoísmo da obsessão.

O amor louco pede uma sexualidade incomum, da mesma forma que a feitiçaria exige uma consciência incomum. O mundo anglo-saxão pós-protestante canaliza toda sua sensualidade reprimida para a publicidade & divide-se entre multidões conflitante: caretas histéricos versus donas promíscuas & ex-ex-solteiros. O AL não quer se alistar no exército de ninguém, não toma partido na Guerra dos Sexos, entedia-se com os argumentos a favor de iguais oportunidades de trabalho (na verdade, recusa-se a trabalhar para ganhar a vida), não reclama, não explica, nunca vota & nunca paga impostos.

O AL gostaria de ver todo bastardo ("filho natural") chegar no fim de sua gestão & nascer - o AL vive de aparelhos antientrópicos - o AL adora ser molestado por crianças - o AL é melhor que preces, melhor que sensimilla - o AL leva para onde for suas próprias palmeiras & sua própria lua. O AL admira o tropicalismo, a sabotagem, a break dance, Laila & Majnun, o cheiro de pólvora & de esperma.

O AL é sempre ilegal, não importa se disfarçado de casamento ou de um grupo de escoteiros - sempre embriagado no vinho de suas próprias secreções ou de fumo de suas virtudes polimorfas. Não é a deterioração dos sentidos, mas sim sua apoteose - não é o resultado da liberdade, mas seu pré-requisito. Lux et voluptas.

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